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LIVROS

OS ÚLTIMOS DIAS DE ELIAS GHANDOUR,

Romance, Faria e Silva/Alta Books, 2023.

É no crepúsculo da própria existência que conhecemos Elias Ghandour, protagonista e narrador deste inquietante romance escrito com rara habilidade pelo paulista Marcelo Maluf. A narrativa se inicia com Ghandour – ou seria um ator o interpretando? – declamando um monólogo sobre a própria vida em cima de um palco. Mas é, de fato, uma peça-dentro-do-romance que a leitora e leitor têm em mãos, ou tudo não passa de um delírio do seu narrador? Esta é só uma das perguntas que nos fazemos ao longo da leitura de Os últimos dias de Elias Ghandour: esse é um romance escrito sob o bem-vindo signo da ambiguidade. Enquanto caminha pelo palco, ou pela sua imaginação dramatizada, Elias Ghandour passa a sua vida a limpo seguindo as marés imprevisíveis da sua memória. Sua sexualidade, seus pais e sua irmã, sua família, seu amante e suas amizades nos são apresentados sob o pano de fundo histórico não só da vida social brasileira, como também da origem árabe do narrador. Ghandour procura tanto um balanço da sua vida, quanto um pleno conhecimento de si. No entanto, e aqui reside uma das forças do romance, a escrita de Marcelo Maluf parece nos dizer que o autoconhecimento não é um ponto de chegada, mas sim um exercício, uma vocação, de construir e de refazer a si mesmo. Ghandour parece falhar nesta jornada da vida? Cabe a cada um de nós ponderar a resposta possível. Memória, história e subjetividade assumem, ao longo do romance, uma dimensão não só de incertezas, como também insólita. Embora não lance mão do sobrenatural, Os últimos dias de Elias Ghandour é construído em parte numa atmosfera e imagética dos romances fantásticos espectrais, violentos. Teatro, imaginação e delírio servem, na prosa de Maluf, para expandir as fronteiras do realismo. A busca pela experiência de uma verdade, neste romance, se intensifica na poesia imaginativa de sua prosa, que retorce e põe em cheque certezas sobre a realidade em si. Aos leitores e leitoras que se encantaram com o seu romance anterior, A imensidão íntima dos carneiros, livro que consagrou Marcelo Maluf como um dos autores mais originais da literatura brasileira contemporânea, Os últimos dias de Elias Ghandour não decepcionará. Pelo contrário, o romance reforça a originalidade e a maturidade de sua voz como romancista.

A IMENSIDÃO ÍNTIMA DOS CARNEIROS  

Faria e Silva/Alta Books, 2023

Romance Vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura, 2016, na categoria estreante.

Este é um romance sobre o medo e suas consequências. O medo da guerra. O medo da imigração, do desconhecido. O medo de se conhecer, de viver em plenitude. O medo do fracasso. O medo da morte. O medo como herança familiar sobrevivendo por gerações e se infiltrando no inconsciente da família. Entretanto, também é um livro sobre redenção, sacrifício e transformação. Assaad Simão Maluf veio do Líbano para o Brasil ainda menino, depois de viver uma tragédia na família, no ano de 1920, período final do domínio do império otomano. Marcelo, seu neto, não o conheceu. Quando nasceu, em janeiro de 1974, Assaad Simão já havia falecido. Apenas sabia de seu avô pelas histórias que contavam os seus pais e tios. Da distância entre avô e neto irrompe a narrativa deste romance evocativo, lírico e sensível. Na busca por compreender sua própria identidade e a dos seus antepassados, Marcelo se vê no ano de 1966, na casa de seu avô, na cidade de Santa Bárbara D’Oeste, interior de São Paulo. Sentado à janela da casa, Assaad escreve em um caderno suas memórias sobre a infância no Líbano, quando pastoreava carneiros nas montanhas de Zahle. ​

ESQUECE TUDO AGORA

Terracota Editora, 2012, contos

Com ligeireza e densidade, cada conto de Marcelo Maluf é uma martelada no sino da existência, um baile de personagens caleidoscópicos e histórias pungentes, que tratam de transcendência e incerteza, nada é o que parece e mesmo que fosse já se alterou. Afinal, a vida é um jogo de sombras onde um raio fugaz é capaz de mudar toda a existência. A realidade é uma construção alicerçada em signos e metáforas, coberta pelo véu imposto pelo limite dos nossos olhos. Algumas pessoas conseguem ultrapassar o véu, outras perguntam: o que você viu lá? Mas não sabem que a descrição não é válida, pois é a experiência de descortinar que importa e os resultados mudam conforme o tato de cada um. No fim, somente signos e metáforas podem ser compartilhados.
A experiência é uma nave de acento único, de uma viagem que não há nada para lembrar, mesmo que seja impossível esquecer.

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